Wednesday, March 19, 2008

Actualidades I.43. Ensinar, à Altura do Nosso Tempo

PINA PRATA, Francisco Xavier – A transformação dos métodos pedagógicos no moderno Ensino Superior. In «A Universidade na Vida Portuguesa». Lisboa: Gabinete de Investigações Sociais, 1969. Vol. 1, p. 163-212.

Excertos:

A reflexão teórica e as «práticas» de nível universitário, que resultam das possibilidades do nosso tempo e que, simultaneamente, são postuladas pelas necessidades específicas de hoje constituem o que frequentemente se chama «moderno ensino superior».

Por seu turno, este ensino, cuja acepção tende a englobar aquilo que vai sendo ministrado nas Universidades sem se lhe restringir, implica já a revisão e adopção de novos métodos que lhe sejam adequados.

Assim, falar na transformação dos métodos é referirmo-nos sistematicamente a um ensino em transformação também.

Isto melhor se vê quando, em vez de empregarmos o substantivo, nos servimos do verbo: ensinar, à altura do nosso tempo, implica, para além das modificações do conteúdo de um programa mais ajustado às ideias e factos da investigação científica e do pensamento e cultura actuais, uma relacionação nova entre professores e alunos. […] E porque os métodos pedagógicos consistem, em última análise, num sistema particular de relações, as mudanças mais ou menos acentuadas daqueles apontam transformações de profundidade diversa no campo da relacionação psicopedagógica, e vice-versa.

Se, no ensino, a transformação dos métodos reveste formas que pressentimos bruscas e que sentimos quase radicais, não se nos afigura que seja tanto devido à natureza de um conteúdo a transmitir ou de técnicas inovadoras, mas, sobretudo, ao facto de nos encontrarmos numa sociedade empenhada na reestruturação de novos modelos sócio-económicos e de padrões renovados de aculturação. Esta sociedade, quer se chame industrial, quer seja a da época da cibernética, ficará marcada não tanto pelo uso dos computadores, como pelo acesso de um número muito maior de indivíduos a um nível de vida mais humanizado, a um campo mais vasto de conhecimentos e de técnicas (do saber e do poder fazer), a moldes sociais da convívio fundados numa participação crescente em tarefas comuns.

São as exigências deste novo tipo de sociedade, em que nos inscrevemos e que vamos instaurando, e a falta de previsão e preparação em lhes dar resposta, que originaram o que em muitos países se denomina a «crise universitária». Pode ser vista esta «crise» como um estado de desequilíbrio entre as funções que a vida de hoje postula que sejam desempenhadas pela Universidade e os limites com que esta se vê a braços para ocupar tal lugar. O grande problema é, pois, o darmo-nos conta do que será a Universidade dos anos que vão rapidamente chegar. Não se trata de uma «crise em si», nem de simples «crise de crescimento». É um mudar arriscado numa sociedade em mutação profunda, com os consequentes receios de diferentes géneros de ruptura, ocasionáveis pela transformação rapidíssima do modo como se nos apresentam e nos rodeiam pessoas e coisas.

Perdemos o pé, porque evolução do clima mental - das «mentalidades», diz-se - não se processa a ritmo correspondente. Passou-se de uma situação normal de equilíbrio instável a um estado de desequilíbrio quase estacionário. (p. 163-165).

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